RESENHA
“A Igreja tem inicio com a pregação
da boa nova, o Reino de Deus manifestado nas palavras, nas obras e na presença
de Cristo”. (cf. LG, n. 5). O presente documento tem sido uma espécie de
facho de luz para a Igreja do Brasil frente aos novos desafios da modernidade,
atendendo aos apelos do Papa João XXIII que influenciou todo o direcionamento
do Concílio Vaticano II, que é a observância dos sinais dos tempos, e o cuidado
de a vida eclesial continuar sendo referencia para os povos e nações. Neste
texto é retomado com maestria o documento de Aparecida (Dap) que nos impulsiona
a sermos discípulos e missionários divulgando a boa nova de Cristo aos povos.
As atividades eclesiais, bem como, as atividades
pastorais dos padres, diáconos e leigos devem está em sintonia para que o
propagar da palavra, o acolhimento aos menos favorecidos e a administração dos
sacramentos não sejam prejudicados, com isso urge uma nova restruturação das
paróquias, deixando ser uma estrutura burocrática para ser um centro de
referencia de vida pastoral e vivencia evangélica, inspirado nas primeiras
comunidades cristãs pós-testamentárias.
Introduzindo nessa
problemática de comunidade, o texto nos leva a pensar a paróquia durante os muitos
séculos que se passaram que tem sido presença pública da Igreja, porém as mudanças
e os novos desafios de nossa época, bem como a secularização diminuíram sua
influência na vida da sociedade. Com isto cresce o desafio de renová-la tendo em vista sua missão de
evangelizar sempre. A Evangelii Gaudium diz que a paróquia “não é uma estrutura caduca” e
essas também tem sido temas de constantes discursos do papa Francisco que nos
convida a romper com as estruturas que mais sistematizam do que possibilita a
graça.
A paróquia possui
uma plasticidade e pode assumir formas diferentes, e é fundamental que tenha
docilidade e criatividade na missionariedade. Precisa ter novo olhar, novas reflexões e nova prática
pastoral hoje. Com isso o nosso desafio é observar os sinais dos
tempos que interpelam a paróquia hodierna, detectar aspectos da realidade que
clamam por conversão pastoral e recupera dados bíblicos sobre as primeiras
comunidades cristãs.
É preciso ir às
fontes para haver conversão dessa estrutura, é importante recuperar os pontos históricos
que merecem atenção e evidenciar os fundamentos eclesiológicos da comunidade no contexto do Vaticano II, destacar os sujeitos
e as tarefas de conversão pastoral na paróquia. O documento aprofunda na
proposta onde nos são apresentadas novas propostas para essa comunidade de
comunidades.
No capítulo II, tratamos especificamente
da expressão “Sinais dos tempos” do saudoso papa João XXIII e o aplicamos
temática da conversão pastoral. O Vaticano II propõe diálogo na relação da Igreja
com a sociedade. Nessa ótica, a
Igreja passa a conhecer os “sinais dos tempos”, e a presença de Deus iluminando
a sua missão, ela deve se revitalizar sempre através da ação do Espírito Santo,
pois a sua identidade vem do Espírito
Santo que a renova sempre e todas as coisas.
As novas realidades
de nossos tempos devem ser vistas com olhos de discípulos missionários, não devemos
conservar o sentimento de pessimismo diante do que nos desafia, mas antes,
preservar um olhar que
esteja nutrido pelo Evangelho e na ação do Espírito, dessa forma, esses novos contextos e desafios devem nos
inspirar à novas oportunidades de nos repensar e mudar as direções sempre que possível
e necessário.
O Documento ainda
nos chama a atenção para as novas tecnologias e os avanços da informática que
tem proporcionado experiências inimagináveis em diversos campos da vida, essa emergência
da subjetividade nos apresenta pontos positivos e outros negativos, o nosso desafio é encará-los
com nova mentalidade afim de fazer crescer a identidade social, sem deixar enfraquecer
os vínculos comunitários. Há um despertar do ego e uma incrível dificuldade de
alguns diante de todo esse aparato, não conseguirem pensar no outro e na
dimensão da partilha.
Dentre outras perdas, diante das tecnologias e informatizações que nos individualizam destacam-se a diminuição da liberdade e da autonomia, a dispensa da família, a ausência da religião e com isso a decadência sistemática da sociedade. Nos direitos individuais, cresce a indiferença em relação ao outro ganha relevância. Dificulta-se o planejamento do futuro, porque o que conta é o presente, o “aqui e o agora”.
É a cultura
imediatista que afeta a todos, principalmente os jovens. Esta cultura
individualista, que compra satisfação, ajuda os shoppings continua a gerar e a pobreza, a violência,
a exclusão social e a cultura do descartável. Temos grandes cidades, que
crescem de forma desordenada e rápida e isto dificulta a pastoral e os agentes que
ficam na pastoral de manutenção. Os migrantes caem no anonimato e solidão, porque são mal acolhidos.
Os meios de
comunicação mudam hábitos e criam necessidades, a Internet é território sem
fronteira e cria novos espaços e horizontes. Com isso a Igreja precisa saber
inculturar o Evangelho no contexto virtual, a renovação paroquial exige novas
formas de evangelizar e novas estrturas. Essa sociedade tem se pautado pelo
laicismo e pela secularização, com isso o cristianismo perde a influência em
decisões morais da sociedade.
O texto merece uma
leitura atenciosa, pois há diversas realidades que confrontam com as nossas,
pois sabemos que o texto não fora elaborado com pauta na visão teórica da vida
da comunidade, ele fora o primeiro documento que teve a participação maciça da
opinião da comunidade, por isso, podemos afirmar que essas realidades nos
representam de forma abrange. O capitulo I termina com uma belíssima proposta “Há
de fato, uma real necessidade de maior ousadia missionária no anúncio do
querigma frente a esses novos desafios.”
Para não delongarmos demasiadamente na
elaboração do resumo, tendo em vista a riqueza de detalhes do texto original,
tentaremos de forma sucinta apresentar alguns tópicos dos capítulos seguintes que
mereceram maior destaque. A
Palavra de Deus, vida e missão nas comunidades. No antigo Israel, a comunidade era firmada
pela Aliança com Deus, o povo israelita era chamado de povo eleito e convocado por Deus. Os vínculos
sempre foram importantes na vida comunitários e da familia em Israel. No tempo
de Jesus os impostos levavam as famílias ao fechamento, Jesus participava da vida comunitária
testemunhando a seu favor e de sua relação de proximidade com o Pai. Neste
contexto, Jesus é o novo
modo de ser pastor, Ele se apresenta como Bom Pastor e acolhe com bondade e ternura a sua
ovelha.
Jesus nos apresenta
o novo modo de acolher as pessoas indo ao seu encontro, Ele tinha um cuidado especial com os pobres
que eram pessoas excluídas da sociedade. Jesus ensinava usando linguagem simples e todos
entendiam e se sentiam representados. A comunidade de Jesus estava inserida na perspectiva do Reino
de Deus, pois ele tinha a certeza e consciência clara de sua missão de evangelizar, Ele entrava nas casas das famílias e
incentivava os apóstolos a isto.
No contexto
evangélico, entrar na casa significava entrar na vida das pequenas comunidades,
com isso ao lado de Jesus nasceu a comunidade formada pelos discípulos. As
comunidades seguiam aprendendo um novo jeito de viver preservando as marcas da simplicidade, igualdade,
partilha, amizade, serviço e perdão. No que tange à oração em comum, alegria, hospitalidade, comunhão
e acolhida, Jesus inspira em suas ações, a nova forma de ser e agir em
comunidade numa cultura de contrastes.
Ainda no capítulo II, nos é
apresentada o Reino de
Deus que implica uma nova
maneira de viver e conviver em Cristo. Essa novidade deve ser exemplo paras as nossas
comunidades inspiradas nas primeiras comunidades cristãs, onde os apóstolos
reconhecem o ressuscitado que nos envia o Espírito Santo. É o Espírito Santo quem
desperta os carismas e guia a Igreja em suas decisões, a partir daí, os
apóstolos criam as comunidades marcadas pela fé. Neste contexto as comunidades
eram a reunião de fieis que se sentiam chamados e vocacionados. Os cristãos
perseveravam na comunhão, na fração do pão e nas orações.
No capítulo III o texto nos leva a
refletir no surgimento da paróquia e sua evolução. A dimensão
comunitária da fé passou por mudanças significativas, a paróquia atual começou como Igreja
Doméstica, a partir das famílias. Ela é um instrumento importante de identificação
da vida cristã. Há aspectos históricos que devem ser recuperados e outros
revistos. As comunidades cristãs primitivas não perderam
esperança em Cristo, pelo contrario, mesmo com as perseguições do Império Romano, foram
fieis na fé e nos ensinamentos de Cristo. Os cristãos eram disfarçados na
clandestinidade e muitos foram martirizados para defenderem a fé que
professamos hoje, o refúgio dos cristãos no tempo de contrastes era nas comunidades. Nesse contexto aprofundou-se a ideia
de que a fraternidade e separação de costumes pagãos marcavam autenticamente a
vida em comunidade.
Com a alvorada dos
grandes desafios da Igreja nativa, cresceu-se o sentido de irmandade e os
cristãos eram chamados de irmãos, cuidavam das viúvas, dos desempregados, dos presos,
dos órfãos, dos velhos e dos doentes. No jejum, destinavam aos pobres tudo o
que deixavam de
consumir, daí foram
surgindo as obras de caridade que chegam até os dias de hoje. Os contrastes
eram enormes, mas a Igreja cumpria sua missão de ser testemunha fiel do Cristo ressuscitado.
A partir do edito
de Milão, em 313, fora declarada a liberdade religiosa no Império Romano, com o
edito de Tessalônica em 381,
de Teodósio, o catolicismo tornou-se a religião oficial do Império, aos poucos, o cristianismo
foi se tornando a religião massiva e anônima. Essas novas organizações
prejudicaram a relação existente de Igreja-casa, porem no final do séc. III
surgem os lugares fixos para o culto, chamados de “domus ecclesiae”, ali eram
feitas as reuniões da comunidade, sob direção de presbítero.
Final do séc. IV,
em Roma, os lugares de culto chamavam-se “titulus”, é só no séc. V é que aparece
a paróquia com maior autonomia
e com diversas funções. Aos poucos, o sistema paroquial vai se impondo também na cidade, daí
surge a paróquia já com demarcações territoriais e as dioceses. Nas paróquias a
eucaristia passou a ser extensão da ação episcopal. O presbítero realizava os ritos batismais e o bispo os da
crisma.
As paróquias rurais
foram aos poucos se estendendo para as cidades, e em 476 aconteceu o fim do
Império Romano do ocidente, houve a invasão dos bárbaros, que assimilaram a
cultura romana, daí começa uma nova etapa nas comunidades cristãs, ou seja a estreita ligação entre a
Igreja, o Estado e a sociedade, aparecem as Ordens Religiosas e os Mosteiros
com novas espiritualidades, o mundo se torna dividido em dois polos: o temporal
e o espiritual.
Nesse período o
papa Gregório VII, de
Cluny, assume o pontificado e é coroado como Imperador e da inicio à reforma gregoriana
em busca das origens baseadas nas primeiras comunidades apostólicas, e ao mesmo
tempo, afirmava o poder papal contra as ameaças dos senhores feudais. A Igreja
passa a ser mais instituição jurídica do que sacramental e a paróquia continuava sendo referência para os
cristãos. O Concílio de Trento,
no séc. XVI, não modificou o perfil dessa estrutura da paroquial, mas insistiu
que o pároco passasse a residir no território da paróquia, estabeleceu
critérios da territorialidade e da criação de novas paróquias. Esse Concílio
instituiu o Seminário para a formação sacerdotal, e esse modelo de paróquia do
Concílio citado chegou até o Vaticano II.
A terceira parte do
terceiro capítulo nos é apresentado o século XVI e o catolicismo vindo da
Europa chegando ao Brasil, nessa parte o documento trata das diversas características
da Igreja do Brasil. O fato histórico do descobrimento tem relação estreita com ordens religiosas e
irmandades. As ordens
religiosas insistiam em devoções particulares nas regiões litorâneas da recém-encontrada
terra de Santa Cruz. Em 1855, medidas drásticas do Império fazem fechar os
noviciados no Brasil minguando assim as vocações para o sacerdócio. As Irmandades,
abaladas fecharam encerrando suas atividades e outras se secularizaram. O cristianismo ainda apostava nas tradições
populares do povo e nas dimensões devocionais. As paróquias ficaram como únicas
instâncias do catolicismo no país, com a chegada da Proclamação da República em
1889, a situação mudou, chegaram as congregações religiosas trazendo o modelo europeu.
Em suas propostas
foram dado maior destaque para a escola católica e ajuda nas paróquias, com
isso a pluralidade, não era preocupação para a unidade das paróquias. Os católicos
leigos reuniam-se em associações, com muita reza e pouca missa.
No século XIX
ocorreu o chamado processo de instauração, a intenção era introduzir no Brasil a reforma do Concílio de Trento, mas
continuava a busca por festas, procissões e culto aos santos. A paróquia ficou
sendo lugar como de exclusividade do padre, os leigos a procuram apenas para
atos religiosos e
sacramentos, sua
finalidade era para atender às necessidades das famílias católicas. Em 1917, o
CDC definiu paróquia como menor circunscrição local e pastoral. Já no Concílio Vaticano II ela é compreendida
a partir da diocese, ou seja, é entendida como célula da diocese, ou comunidade local dos fieis.
Na conclusão do
capítulo III a CNBB, nos faz o apelo a proporcionarmos o crescimento de uma
paroquia mais discípula e missionaria. No capítulo IV, o documento nos
implica a pensarmos no fundamento da comunidade-Igreja a partir da espiritualidade da
Santíssima Trindade. Pelo Espírito Santo
ela recebe o dom da unidade, que se expressa na paróquia. A paróquia é a extensão da Igreja Particular e
da Eucaristia episcopal. O Vaticano II a define como sendo a “célula da
diocese”, essa célula deve considerar sempre a Santíssima Trindade como fonte e meta da
comunidade, a Igreja,
projeto do Pai, criatura do Filho e vivificada pelo Espírito Santo.
No capítulo V, destacam-se os sujeitos
e as tarefas da conversão pastoral. Os fieis leigos e ordenados participam efetivamente dessa
conversão pastoral. Os sujeitos e as tarefas dependem de encontro pessoal com
Jesus. É Ele que nos apresenta um novo jeito de agir e cuidar das pessoas. A
conversão paroquial depende de um renovado amor à pastoral, a fonte primeira
para isto está no Batismo e na Ordem. O missionário tem que ser presença
evangelizadora nas periferias, mas infelizmente ainda há o medo de sair do centro, de
descentralizar que prejudica a tão necessária conversão.
As proposições pastorais, bem como o
desafio de superar a
tentação pastoral de agir com as próprias forças são destacadas nas reflexões do
capítulo VI. A luz da palavra do evangelho ouvimos o forte alerta “sem Cristo
nada podemos fazer” (Jo
15, 5), o papa Francisco tem nos exortado à “nunca haver uma evangelização sem o
Espírito Santo”. Comunidades da comunidade paroquial, a grande comunidade
deve formar grupos menores para descentralizar, com isto se consegue chegar aos
mais afastados criando
novas unidades. A setorização vai ajudar na renovação se forem formadas lideranças, e
o protagonismo dos leigos depende de boa preparação dos agentes de pastorais.
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