CRÔNICA: Empinar pipas é um esporte para mim, apesar de pouca prática, um tanto quanto
intrigante, acho que é devido ao fato de colocarmos um objeto feito de plástico
e bambu para voar, sendo que a possibilidade de rasgar o céu e alçar voo faz parte
do imaginário de todo homem, mas o angustia saber que lhe foi privada essa possibilidade
por natureza definitiva, afinal de contas, não fomos criados com um par de asas
como os pássaros. Voar é um privilégio dado aos pássaros.
Consideremos
que a pipa já esteja pronta. Para que o nosso texto não se delongue
demasiadamente. A pipa pode ser com ou sem rabiola, não faz diferença, e o dia
está belo. Num verão de ventos uivantes, que assubiam aos nossos ouvidos convidando-nos
a brincar um pouco num campo ou parque, fora do alcance da rede elétrica. O
maior desafio do esporte é manter a pipa no céu e fazê-la, quando possível,
bailar para um lado e para o outro, exibindo sua beleza. Quando a corda pesa em
nossas mãos, é sinal que o vento pede pra dar corda, para que a pipa vá ainda
mais longe. Dar cordas quando o vento pede até uma criança de três anos pode
fazer, pois basta segurar firme o carretel de linha e aponta-lo para o alto e
deixar que o próprio vento faça o seu papel, descarregando a linha e levando a
pipa.
O
desafio mesmo é administrar os ventos, saber o momento exato de dar cordas ou
de puxá-las. É saber que há momentos em que podemos deixa-la ir, partir e não
permitir que esse “descarrêgo” de linhas não seja tanto ao ponto de ela chegar
ao chão ou se agarrar em alguma arvore ou edifício. Também é desafio de quem
pratica tal esporte, fazê-la bailar no céu. A beleza da pipa está no espetáculo
pirotécnico que ela é capaz de fazer, como se tivesse mostrando ao seu dono pra
quê que veio ao mundo. Quando o vento se vai, ou se cansou de brincar, é hora
da parte mais chata, que é puxar a pipa, enrolar a linha, desembaraçar os nós.
É
mais ou menos igual em nossos relacionamentos. E quando eu o digo, digo-o de
forma geral, relacionamentos entre pais e filhos, esposos e esposas, entre amigos,
entre colegas de trabalho e etc. As pipas e os relacionamentos têm mais em
comum do que possa calcular nossa vã psicologia. Devemos compreender que a
centralidade das soluções dos nossos conflitos não pode está no “dar cordas”,
algo que as pipas nos ensinam que não precisa de muitos esforços. Nosso desafio
para ressaltar a beleza construtiva que pode haver nos relacionamentos sadios é
manter a pipa no alto, ou seja, administrar bem os ventos e ter a temperança de
bailar por entre eles, ainda que nos desafiem na maioria do tempo. Muitos
interpretam os ventos de nossas vidas como algo ruim. Que dirá a tempestade. Mas
sem os ventos não há pipas no alto, e sem os desafios não há relacionamentos
maduros.
Para
concluir, antes que se torne enfadonho, e você desista de ler o texto até o fim,
ressalto que há algo de maior exigência para os relacionamentos do que para o
esporte das pipas. Um preguiçoso empina a pipa e quando se cansa, toma entre
duas, uma decisão cômoda; ou ele arrebenta a linha e se desfaz de tudo e vai
embora descansar, sabendo que na próxima semana pode ir ao mercado e comprar quantas
linhas e pipas novas quiser, ou ele puxa a pipa, sem a preocupação de enrolá-la
no carretel, aproveita a pipa e se desfaz das linhas que ha essa altura está
cheia de nós. Nos relacionamentos não há mercados, não há como arrebentar a
linha. Ou puxamos a linha com o cuidado de enrolá-la ao carretel, ou
pacientemente gastemos um pouco mais de tempo para desfazer os nós causados
pela presa de puxar as pipas.
Devemos
gastar tempo, paciência, meditação e oração para solucionar os nossos conflitos,
não podemos ser indiferentes a eles, sem dar a importância que lhe é devida.
Assim sendo, o céu de nossas vidas precisa ser enfeitado com as pipas dos
relacionamentos sadios, de cores diversas e que dão mais brilho aos nossos
regaços.
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